Em 29 de março de 2015 às 13:50
Do Redeeconews.com no Nordeste
Quem entra na reserva pela primeira vez se surpreende. A vegetação própria
da Mata Atlântica mostra forte ligação com formações da Caatinga, a
vegetação típica do semiárido, ou do Cerrado, encontrando-se espécies
como Melocactus depressus (uma das espécies de coroa-de-frade) Acacia (Acácia), Anadenanthera (Angico-do-cerrado), Croton (Sangra d’água), Spondias (cajá), Hymenaea courbaril (Jatobá), Tabebuia avellanedae (Pau d’árco roxo), entre outras.
Nas três áreas e seu entorno, a vegetação é constituída por formações
secundárias florestais e savânicas, áreas de tensão ecológica existentes
nos contatos entre essas duas formações e sistemas secundários ou
antrópicos, aqueles modificados pela intervenção humana.
O relevo também chama a atenção. Predominam planícies fluviais e marinhas - com grande acúmulo de sedimentos de origem marinha, fluvial e lacustre - e os tabuleiros costeiros, que possuem uma cobertura arenosa branca com aproximadamente um metro de espessura, encobrindo sedimentos areno-argilosos. De acordo com o Plano de Manejo da reserva, o Cerrado encontrado nos tabuleiros reforça a hipótese dessas áreas serem remanescentes de uma distribuição mais ampla e antiga dos domínios dos Cerrados.
O documento que define o plano de manejo da Rebio Guaribas relata que,
nos séculos XVI e XVII, o litoral paraibano foi alvo da introdução do
cultivo da cana-de-açúcar, especialmente nas várzeas dos rios Paraíba,
Mamanguape, Una Miriri, Camaratuba e Gramane. Os rios Camaratuba e
Mamanguape são os mais próximos à Rebio Guaribas e estão diretamente
relacionados às comunidades do entorno da reserva.
O solo e o clima favoráveis fizeram com que a indústria canavieira se desenvolvesse no litoral paraibano, desencadeando o surgimento dos primeiros engenhos. Do século XVI até o século XX, processos contínuos de expulsão do agricultor tradicional descapitalizado e dos grupos indígenas ocorreram à medida que a monocultura da cana-de-açúcar ia sendo estabelecida. Ainda assim, conviviam no mesmo espaço agrário os grandes monocultores, os pequenos e dependentes agricultores e os índios Potiguara.
No século XX, os conflitos relativos ao uso do espaço e dos recursos ambientais tornaram-se mais acirrados.
No início da década de 1960, o modelo colonizador já havia destruído grande parte da Mata Atlântica em favor da plantação da cana-de-açúcar, mas o cultivo se limitava às várzeas de solos aluviais e algumas encostas do tabuleiro. Nessa época, apenas cinco usinas dominavam todo o cenário do litoral paraibano.
Os solos pobres e arenosos da região, na visão da época, garantiam a presença de muitas lavouras de subsistência e de extratos de Mata Atlântica, já que os mesmos não eram aproveitados pelos produtores da cana.
Proálcool e pressões
Um novo impacto na região ocorreu em 1975, com a criação do Programa Nacional do Álcool (Proálcool), lançado com o objetivo de conter gastos com a importação de petróleo. O governo federal ofereceu créditos subsidiados aos produtores de cana-de-açúcar e desencadeou um novo ciclo de ocupação das terras anteriormente destinadas à pequena agricultura, ocupação indígena e áreas de vegetação natural, provocando alterações na dinâmica e na organização do espaço rural da porção oriental do Estado da Paraíba.
Do Redeeconews.com no Nordeste
Abelha-azul na Rebio Guaribas Foto: LSoares/Redeeconews.com |
Numa paisagem dominada por vastos
canaviais, três áreas descontínuas de Mata Atlântica despontam como
sinais de sobrevivência da floresta a aproximadamente 50 quilômetros da
capital paraibana, João Pessoa: elas formam a Reserva Biológica
Guaribas, administrada pelo Instituto Chico Mendes para Conservação e
Biodiversidade (ICMBio). Duas dessas áreas estão localizadas no Município de Mamanguape (PB). A terceira, separada das demais pela
BR-101, é praticamente envolvida pela zona urbana de Rio Tinto (PB).
Juntas, somam 4.028 hectares.
O desmatamento e a caça provocaram o desaparecimento de algumas espécies na região, como porcos-do-mato, veados, anta, primatas e grandes carnívoros, entre eles as onças.
O desmatamento e a caça provocaram o desaparecimento de algumas espécies na região, como porcos-do-mato, veados, anta, primatas e grandes carnívoros, entre eles as onças.
Guariba-de-mãos-ruivas |
A Rebio Guaribas abriga centenas de espécies vegetais e animais, muitas
incluídas na lista de espécies brasileiras ameaçadas de extinção. Uma
delas, o guaribas-de-mãos-ruivas (Allouata belzebul)
inspirou o nome da reserva. Eles são raros no Nordeste, até mesmo nesse
recorte preservado do bioma. E foi pura sorte a equipe do
Redeeconews.com conseguir gravar imagens de um pequeno grupo desses
primatas nas copas das árvores, após uma longa trilha (clique aqui para acessar vídeo).
Outra raridade, fotografada só a grande distância pela nossa equipe, foi um único inseto reluzente, de cor verde-azulada, visitando flores por um breve instante. Pela foto, o analista ambiental do ICMBio, Afonso Leal, identificou de imediato como sendo uma abelha (Ordem Hymenoptera, superfamília Apoidea), “por causa das pernas posteriores dilatadas e o aparelho bucal longo”. Ele enviou a foto ao entomólogo Celso Feitosa Martins, professor da Universidade Federal da Paraíba, que confirmou a informação. Martins acrescentou que a abelha pertence à tribo Euglossini. As espécies dessa tribo estão entre as mais importantes pelo trabalho de polinização de muitas espécies nativas de florestas tropicais. São conhecidas como “abelhas das orquídeas”, porque os machos apresentam uma íntima relação com as flores de um grande número de espécies da família Orchidaceae.
Cerrado e Caatinga na Mata
Outra raridade, fotografada só a grande distância pela nossa equipe, foi um único inseto reluzente, de cor verde-azulada, visitando flores por um breve instante. Pela foto, o analista ambiental do ICMBio, Afonso Leal, identificou de imediato como sendo uma abelha (Ordem Hymenoptera, superfamília Apoidea), “por causa das pernas posteriores dilatadas e o aparelho bucal longo”. Ele enviou a foto ao entomólogo Celso Feitosa Martins, professor da Universidade Federal da Paraíba, que confirmou a informação. Martins acrescentou que a abelha pertence à tribo Euglossini. As espécies dessa tribo estão entre as mais importantes pelo trabalho de polinização de muitas espécies nativas de florestas tropicais. São conhecidas como “abelhas das orquídeas”, porque os machos apresentam uma íntima relação com as flores de um grande número de espécies da família Orchidaceae.
Cerrado e Caatinga na Mata
Coroa-de-frade |
Foto: LSoares/Redeeconews.com |
O relevo também chama a atenção. Predominam planícies fluviais e marinhas - com grande acúmulo de sedimentos de origem marinha, fluvial e lacustre - e os tabuleiros costeiros, que possuem uma cobertura arenosa branca com aproximadamente um metro de espessura, encobrindo sedimentos areno-argilosos. De acordo com o Plano de Manejo da reserva, o Cerrado encontrado nos tabuleiros reforça a hipótese dessas áreas serem remanescentes de uma distribuição mais ampla e antiga dos domínios dos Cerrados.
Na região chove entre 1.750 e 2.000 milímetros anuais. A estiagem dura
geralmente entre dois e três meses, de outubro a dezembro. A
evapotranspiração é elevada, com temperaturas que variam de 24 °C a 36 °C.
Pesquisas - Várias pesquisas importantes são realizadas com a participação da equipe da Rebio Guaribas. Uma delas, em andamento, faz parte do Projeto Malha, em parceria com a
Universidade Federal de Lavras (MG), que abriga o Centro Brasileiro de Ecologia de
Estradas, coordenado pelo professor Alex Bager. Os pesquisadores estão
coletando dados sobre atropelamentos de fauna nas rodovias do entorno.
"Há também interação com universidades federais e estaduais do Rio do Grande do Norte, Pernambuco e Paraíba, entre outras. Em um dos trabalhos, pesquisadores da UFPB e da Fiocruz realizam expedições num estudo sobre Leishmania e Tripanossoma na Mata Atlântica. Há ainda pesquisas com insetívoras (Drosera) e um importante trabalho com ecologia de pequenos mamíferos, que irá estudar como essa fauna se comporta entre a reserva biológica e o canavial", disse o chefe da Rebio, Getúlio Freitas.
Espécies – Atualmente, os analistas ambientais do ICMBio estão fazendo um novo levantamento das espécies da Rebio Guaribas, juntamente com profissionais de várias instituições que desenvolvem ou desenvolveram pesquisas de mestrado e doutorado nas três áreas da reserva.
Mas o levantamento original dá uma dimensão da importância da área preservada: espécies como Manilkara salzmanii (Massaranduba), Tabebuia spp. (Pau d’arco), Apuleia leiocarpa (Jitaí-amarelo), Bowdichia virgilioides (Sucupira), Brosimum discolor (Quiri), Ficus sp. (Gameleira), Cariniana legalis (Jequitibá Rosa) e Lecythis luschnathii (Sucupira) destacam-se pelo elevado porte dos indivíduos com que são frequentemente encontrados no interior da floresta.
Pesquisas - Várias pesquisas importantes são realizadas com a participação da equipe da Rebio Guaribas. Uma delas, em andamento, faz parte do Projeto Malha, em parceria com a
Mangaba |
"Há também interação com universidades federais e estaduais do Rio do Grande do Norte, Pernambuco e Paraíba, entre outras. Em um dos trabalhos, pesquisadores da UFPB e da Fiocruz realizam expedições num estudo sobre Leishmania e Tripanossoma na Mata Atlântica. Há ainda pesquisas com insetívoras (Drosera) e um importante trabalho com ecologia de pequenos mamíferos, que irá estudar como essa fauna se comporta entre a reserva biológica e o canavial", disse o chefe da Rebio, Getúlio Freitas.
Espécies – Atualmente, os analistas ambientais do ICMBio estão fazendo um novo levantamento das espécies da Rebio Guaribas, juntamente com profissionais de várias instituições que desenvolvem ou desenvolveram pesquisas de mestrado e doutorado nas três áreas da reserva.
Mas o levantamento original dá uma dimensão da importância da área preservada: espécies como Manilkara salzmanii (Massaranduba), Tabebuia spp. (Pau d’arco), Apuleia leiocarpa (Jitaí-amarelo), Bowdichia virgilioides (Sucupira), Brosimum discolor (Quiri), Ficus sp. (Gameleira), Cariniana legalis (Jequitibá Rosa) e Lecythis luschnathii (Sucupira) destacam-se pelo elevado porte dos indivíduos com que são frequentemente encontrados no interior da floresta.
Entre as espécies mais importantes em densidade destacam-se Ocotea bracteosa (Louro), Caesalpinia echinata (Pau Brasil), Protium heptaphyllum (Amescuaba/Amesclão), P. spruceanum (Amescla de resina, cheiro) e Inga blanchetiana (Ingá caixão).
No sub-bosque, predominam Piper arboreum e P. caldense (ambas, Pimenta-de-macaco), enquanto que no estrato herbáceo-arbustivo, Heliconia acuminata (Flor-papagaio) e H. hirsuta (Três hastes), além de várias espécies de Pteridophytas.
Das espécies arbóreas e arbustivas mais abundantes, destacam-se Anacardium occidentale (caju), Byrsonima sp (murici), Curatella americana (Caju bravo), Hancornia speciosa (Mangabeira) e Ouratea hexasperma (Bate butá).
Histórico
Vegetação na área de tabuleiro Foto: LSoares |
Das espécies arbóreas e arbustivas mais abundantes, destacam-se Anacardium occidentale (caju), Byrsonima sp (murici), Curatella americana (Caju bravo), Hancornia speciosa (Mangabeira) e Ouratea hexasperma (Bate butá).
Histórico
Rebio Guaribas Foto: LSoares/Redeeconews.com |
O solo e o clima favoráveis fizeram com que a indústria canavieira se desenvolvesse no litoral paraibano, desencadeando o surgimento dos primeiros engenhos. Do século XVI até o século XX, processos contínuos de expulsão do agricultor tradicional descapitalizado e dos grupos indígenas ocorreram à medida que a monocultura da cana-de-açúcar ia sendo estabelecida. Ainda assim, conviviam no mesmo espaço agrário os grandes monocultores, os pequenos e dependentes agricultores e os índios Potiguara.
No século XX, os conflitos relativos ao uso do espaço e dos recursos ambientais tornaram-se mais acirrados.
No início da década de 1960, o modelo colonizador já havia destruído grande parte da Mata Atlântica em favor da plantação da cana-de-açúcar, mas o cultivo se limitava às várzeas de solos aluviais e algumas encostas do tabuleiro. Nessa época, apenas cinco usinas dominavam todo o cenário do litoral paraibano.
Os solos pobres e arenosos da região, na visão da época, garantiam a presença de muitas lavouras de subsistência e de extratos de Mata Atlântica, já que os mesmos não eram aproveitados pelos produtores da cana.
Proálcool e pressões
Um novo impacto na região ocorreu em 1975, com a criação do Programa Nacional do Álcool (Proálcool), lançado com o objetivo de conter gastos com a importação de petróleo. O governo federal ofereceu créditos subsidiados aos produtores de cana-de-açúcar e desencadeou um novo ciclo de ocupação das terras anteriormente destinadas à pequena agricultura, ocupação indígena e áreas de vegetação natural, provocando alterações na dinâmica e na organização do espaço rural da porção oriental do Estado da Paraíba.
Somente em janeiro de 1990 foi
oficialmente criada a Reserva Biológica Guaribas. O processo de
implantação se iniciou com a transferência definitiva das terras que
anteriormente constituíam reservas legais de assentamentos do INCRA nos
municípios de Mamanguape e Rio Tinto para a Secretaria de Meio Ambiente
(SEMA).
Os três fragmentos que formam a Rebio Guaribas são denominados Sema 1, 2 e 3
(alusão à antiga Secretaria Especial de Meio Ambiente, que antecedeu o
Ministério do Meio Ambiente).
Atualmente, existe a expectativa de interligar as áreas de reserva em Mamanguape (Sema 1 e 2), para ampliar as condições de sobrevivência das espécies, ameaçadas pela fragmentação causada por rodovias (BR-101 e rodovias estaduais), cultivos agrícolas e atividades industriais.
Apesar da fiscalização, outras ameaças também persistem: a caça, a retirada de madeira e alguns incêndios na mata. Uma pequena equipe de brigadistas trabalha para proteger as plantas e os animais. Eles dizem que as investidas diminuíram, mas reconhecem que ainda falta muito para acabar.
Fonte
Projeto prevê interligar áreas 1 e 2 |
Atualmente, existe a expectativa de interligar as áreas de reserva em Mamanguape (Sema 1 e 2), para ampliar as condições de sobrevivência das espécies, ameaçadas pela fragmentação causada por rodovias (BR-101 e rodovias estaduais), cultivos agrícolas e atividades industriais.
Apesar da fiscalização, outras ameaças também persistem: a caça, a retirada de madeira e alguns incêndios na mata. Uma pequena equipe de brigadistas trabalha para proteger as plantas e os animais. Eles dizem que as investidas diminuíram, mas reconhecem que ainda falta muito para acabar.
Fonte