A praia de Tambaba pode estar com os dias
contados. Indicada pelo portal Brasil Naturista como sendo a praia mais
conhecida do segmento, no plano internacional, além de ter sido sede do
30º Congresso Internacional de Naturismo, em 2008, a praia integra a
Área de Proteção Estadual de Tambaba, criada pelo decreto estadual
22.882, de 26 de março de 2002. Adjacente à praia de Tambaba,
encontra-se uma extensão de Mata Atlântica que está em pleno processo de
recomposição, desde o desmatamento provocado pelo mercado imobiliário,
com a demarcação de vários loteamentos, na década de 80. Em apenas 30
anos, esse nicho de Mata Atlântica expressa, através dessa força que se
reconstitui, o símbolo de um organismo que insiste em viver. Essa
Unidade de Conservação está ameaçada de ter um de seus recantos mais
nobres extinto para dar lugar a gigantesco complexo turístico, composto
de quatro resorts, com 1.892 apartamentos, um campo de golfe de 18
buracos, quatro condomínios com 959 lotes residenciais, três pousadas
com 288 unidades habitacionais, três clubes, un centro comercial e
estacionamentos com 1.400 vagas.
Todo trecho da praia de Tambaba, praia
naturista conhecida internacionalmente, se insere na APA de mesmo nome e
apresenta orla exposta, retilínea, com grandes falésias e estreita
faixa de praia. A erosão é bastante intensa na área atuando diretamente
sobre as falésias favorecendo voçorocas. No trecho predomina cobertura
do bioma da Mata Atlântica em estágio de regeneração. Possui grande
concentração de arrecifes areníticos, com formatos interpretativos como
Pedra da Baleia, da Caveira, do Elefante, etc.
O anúncio desse megaprojeto turístico
assusta muita gente. Assusta a população local, assusta os
ambientalistas e assusta as ONGs que defendem a natureza. É
compreensível que o prestígio que Tambaba conquistou ao longo dos anos
provoque todo tipo de fantasias na mente consumidora, mas
empreendimentos dessa magnitude deveriam ser instalados em áreas já
antropisadas, que existem várias na região.
Ao sair de Tambaba, registrei um crime ambiental que para queimar a
mata que fica na fronteira da Área de Proteção Ambiental de Tambaba e o
assentamento rural denominado Sítio Tambaba. Para incendiar, sem nenhuma
precaução, quatro lotes de 15x35m, os proprietários causaram incêndio
que atingiu uma extensão aproximada de 10 hectares. Restaram na área a
mesa construída com parte da madeira derrubada, o banco, troncos
calcinados e vestígios de uma divertida bebedeira com muitas latas de
cerveja.
Antônio Augusto de Almeida - ENTREVISTA
“A agressão à APA de Tambaba é um triste exemplo. A verdade é que gestão ambiental em nosso estado – e muito no Brasil inteiro - é somente formalidade para mascarar a legalidade”.
O engenheiro Antônio Augusto de Almeida
tem histórico de seriedade e de luta pelas questões ambientais.
Professor, ambientalista, sanitarista, Antônio Augusto foi secretário de
Meio Ambiente de João Pessoa, na gestão do prefeito Ricardo Coutinho,
atual governador do Estado da Paraíba, e é vice-presidente da Associação
dos Amigos da Natureza. (RM)
Folha do Meio - O projeto Reserva de Garaú vai ocupar uma área
contínua de 186 hectares. Que impactos ambientais vão ocorrer para a
fauna e flora da região?
Antônio Augusto - A área escolhida para
implantação do projeto é a mais preservada e a que ainda guarda as
características básicas do ecossistema local, entre as quais a fauna
remanescente. As demais áreas já estão antropisadas.
“Essa coisa do empresário imobiliário se apropriar de uma área
notável por suas características naturais e paisagísticas, que é um
patrimônio da sociedade, para agregar valor ao produto e,
consequentemente, maximizar o lucro do capital, é uma velha estratégia
posta em prática nos países que ainda não tem uma consciência da
sustentabilidade”.
FMA - Pelo mapa de ocupação da área, se percebe que a
cobertura florestal a ser conservada corresponde a apenas a uma franja
perimetral a Leste do empreendimento. Nesse caso, a nesga de floresta
residual passaria a exercer uma função paisagística simplesmente?
Antônio Augusto - Exatamente. A flora
que restará terá função simplesmente paisagística para vender o
empreendimento e depois passará a sofrer pressão porque “incomoda” pois
tem custo de manutenção e segurança. Essa coisa do empresário
imobiliário se apropriar de uma área notável por suas características
naturais e paisagísticas, que é um bem comum de todos ou, patrimônio da
sociedade, para agregar valor ao produto e, consequentemente, maximizar o
lucro do capital, é uma velha estratégia posta em prática nos países
que ainda não tem uma consciência da sustentabilidade. Em resumo:
destrói a notabilidade, sai incólume da cena do crime e transfere a
culpa para os compradores e seja lá quem for.
FMA - A área do empreendimento irá ocupar uma extensão de
floresta secundária, do bioma Mata Atlântica, em estágio avançado de
recomposição. A conservação dessa recuperação florestal não poderia
cumprir uma função pedagógica para difundir uma experiência de sucesso
que nasceu do acaso?
Antônio Augusto - Claro que sim, a natureza dá
lições, a todo momento, porém a ganância e a mentalidade da destruição
impedem que se tirem proveito delas.
FMA - Para construir esse complexo turístico, o empreendimento
terá que desflorestar praticamente a área toda. Não seria mais
interessante que esse projeto fosse deslocado para uma área já
degradada?
Antônio Augusto - Sim. A visão da
sustentabilidade econômica e socioambiental aponta para uma apropriação
de um patrimônio natural notável preservado, por uma maioria, inclusive
de empresas, que se instalassem no entorno, passando a gozar de uma
qualidade de vida cada vez melhor. Num país sério, o
responsável por um órgão ambiental que licencia um empreendimento
localizado numa APA, oficialmente instituída, mofaria na cadeia.
FMA - O incremento populacional previsto será de 8.800
pessoas, que corresponde a 41% do total de habitantes do município. Que
impactos poderiam ser causados por essa concentração de população
adicional?
Antônio Augusto - Imagine-se cerca de 9 mil
pessoas, numa estimativa por baixo, e mais de 1.400 veículos trafegando
em áreas pavimentadas. É a urbanização de uma área de preservação.
Infelizmente, em nosso país a culpa por prática de ilícitos, que
implicam em perdas de vidas ou danos coletivos diversos, acaba
diluindo-se e vem a impunidade. Num país sério, o responsável por um
órgão ambiental que licencia um empreendimento localizado numa APA,
oficialmente instituída, mofaria na cadeia.
FMA - Qual seria a vocação turística mais adequada para Tambaba, considerando-se o patrimônio ambiental existente?
Antônio Augusto - Como disse anteriormente ou, ao
invés de matar a galinha dos ovos de ouro, preservá-la, colher e fazer
eclodir seus ovos para se ter novas galinhas.
FMA - As experiências fracassadas de megacomplexos turísticos,
no Brasil e na Espanha, indicariam que a licença ambiental poderia ser
usada para mascarar o loteamento da área?
Antônio Augusto - Sim. Vivemos uma
vulnerabilidade total das instituições responsáveis pela implementação
das bases da sustentabilidade em nosso país, especialmente na Paraíba. A
verdade é que gestão ambiental em nosso estado – e muito no Brasil
inteiro - é somente formalidade para mascarar a legalidade.
FMA - O projeto arquitetônico apresentado não incorpora
nenhuma vinculação sustentável ou comprometida com o turismo ecológico.
De que forma poderia se praticar um turismo ambiental, que garantisse a
manutenção florestal e assegurasse o desenvolvimento econômico
vocacionado da região?
Antônio Augusto - Como já disse, é um projeto,
de um modo geral, votado para o lucro imediato e nisso, como não
poderia deixar de ser, está contribuindo a arquitetura convencional.
FMA - Considerando o prestígio internacional de Tambaba, de
que modo poderia ser praticado o turismo na área, como vetor econômico,
sem impactar o meio ambiente?
Antônio Augusto - Tambaba tem os pré-requisitos
para o desenvolvimento de um turismo sustentável, desde que preservada
na sua integridade. Há inúmeras experiências mundiais e algumas em nosso
país nesse sentido. São muitos os exemplos recentemente divulgados,
guardadas as diferenças culturais, como na Croácia.
FMA - Numa visão macro, que medidas a Prefeitura do Conde
deveria adotar para potencializar a vocação turística natural, sem
causar tantos danos ambientais?
Antônio Augusto - Uma prefeitura como a do
Conde deveria ter, além de uma legislação ambiental consubstanciada no
seu plano diretor, um projeto estratégico de desenvolvimento
sustentável.
Porém, não nos devemos iludir. Como está o sistema eleitoral e o
processo da gestão pública em nosso país e estado, em que não há
continuidade administrativa e o administrador se comporta como dono,
proprietário, não é fácil. A própria comunidade ambiental tem que
reagir. Há que haver mobilização séria na área política e junto aos
órgãos fiscalizadores.
Para salvar Tambaba, a própria comunidade ambiental tem que reagir.
Há que haver mobilização séria na área política e junto aos
órgãos fiscalizadores
Fotos: Reginaldo Marinho
O crime ambiental choca os olhos de
quem visita a APA de Tambaba. O assentamento rural denominado Sítio
Tambaba virou cinza. Aproximadamente 10 hectares foram queimados para
virar lotes de 5x35m. Tambaba está ameaçada de ter um de seus recantos
mais nobres extinto para dar lugar a gigantesco complexo turístico,
composto de quatro resorts, com 1.892 apartamentos, um campo de golfe,
quatro condomínios com 959 lotes residenciais, três pousadas com 288
unidades habitacionais, três clubes, un centro comercial e
estacionamentos com 1.400 vagas.Como licenciar um empreendimento situado dentro de uma APA?
Professor ANDRÉ PIVA adverte:
um absurdo acontece na APA de Tambaba
O grave é que a licença ambiental já foi até previamente concedida
Professor André Piva, da UFPB, e sua filha Alice.
O professor André Piva, da Universidade
Federal da Paraíba, tem conhecimento, experiência e autoridade para
criticar e analisar projetos que envolvem turismo e meio ambiente. André
Piva, Doutorado em Cultura e Sociedade pela Universidade Federal da
Bahia, é o Coordenador do Programa de Pós-graduação lato sensu em
Turismo de Base Local - UFPB. Com vasta experiência em planejamento,
organização e execução de eventos artístico-culturais, especialmente na
cadeia produtiva do turismo, André Piva conhece muito bem o
empreendimento na APA de Tambaba e tem posições. Pesquisador nas áreas
de turismo e cultura em perspectivas da economia criativa e indústrias
criativas. (Reginaldo Marinho)
Violência ambiental - “Tambaba já é oficialmente
considerada como Área de Proteção Ambiental, por isso nosso
estarrecimento com uma licença já previamente concedida, e indícios de
que o empreendimento pode se tornar realidade. Como isso é possível?
Quais as forças e interesses que estão possibilitando tal conduta?”
Massacre na fauna - “Um impacto total e violento.
Vai simplesmente erradicar a fauna do lugar. Não se trata apenas de
extinguir ou expulsar animais silvestres que habitam e sobrevivem da
área, mas de comprometer toda a fauna de uma grande área de todo o
entorno que depende da mata que o projeto vai destruir, ou seja, há
animais do próprio local e de outras áreas que dependem da alimentação
nativa do lugar, de relacionamentos para procriação, de pássaros que lá
vivem e voam para outros locais fazendo o natural trabalho de semeadura,
como também de pássaros que trazem sementes dos outros locais.
O megaempreendimento vai quebrar a contiguidade de áreas
conservadas com áreas em recuperação e o rio com áreas de mangues,
fontes de alimentação da vida silvestre. Vai fechar o contato natural
dos animais com suas fontes de alimentação e, certamente, as construções
e dejetos a serem despejados poluirão o rio e o mangue”.
Na contramão da ONU e da sustentabilidade - “Walter
Aguiar, enquanto representante do governo da Paraíba, disse que o
Estado não tem posição contrária a construção de resorts porque condiz
com a realidade do turismo.Explicou que a tentativa é construir em
conjunto com a sociedade de forma participativa e de maneira
sustentável, levando em conta os objetivos do milênio pautados pela
ONU”.
Esse pensamento nos preocupa. Se o Estado aceita os resorts na
Paraíba por condizer com a realidade do turismo, colocamo-nos, como
pesquisadores, embasados na literatura acadêmico-científica, que o
turismo compatível com tal tipo de empreendimento, nada tem de
sustentável, contrário, portanto, às diretrizes da ONU.
No caso, o empreendimento se torna um oásis de luxo cercado de
favelas. O Estado não pode pender para o poder econômico, beneficiando
poucos privilegiados em detrimento do povo”.
Agressão irrecuperável - “O projeto trará
uma agressão irrecuperável ao meio ambiente, poluição do rio Garaú e
uma urbanização desordenada no entorno, além da extinção da praia
naturista de Tambaba, que é um produto turístico especial, claro que
para públicos específicos, entretanto de grande valor simbólico.
O certo é que o projeto arquitetônico, assim como toda a concepção
do empreendimento nada tem de sustentabilidade, mesmo que no projeto se
diga isso, ou mesmo se tratar de um projeto ecoturístico tudo não passa
de falácias”.
Como confiar na fiscalização? - “É
sabido que os construtores, após o projeto aprovado, não cumprem com o
comprometido e não há como se confiar na fiscalização. Não
vemos quaisquer chances de sustentabilidade estrutural no projeto:
abastecimento de água, coleta de lixo e tratamento de esgotos, formas de
se evitar a favelização da área, estrutura de mobilidade compatível com
o número de público que se quer atrair”.
Desafio do novo prefeito - “O município
do Conde já foi muito agredido e muito depredado, mas ainda dá tempo de
corrigir muita coisa. Temos que pensar em programas macros e micros para
o desenvolvimento de seu turismo em bases exclusivamente sustentáveis. Há
muito o que fazer e muitos desafios para a nova administração. O setor
de turismo conta com pessoal competente, com muita boa vontade, porém
temo se eles realmente conseguirão derrotar interesses poderosos”.
APA de Tambaba - “É fundamental conservar as áreas
da APA de Tambaba. O verde do município deve ser preservado e
valorizado ao máximo, em função do turismo. Há que se incrementar
parques ecológicos, bosques, hortos florestais e florais, estruturas
variadas para práticas ecoturísticas, construções de vias mais
condizentes com o tráfego de veículos, leis mais severas para
construções e aí por diante”.
Área de Proteção Ambiental de Tambaba
A APA tem por finalidade garantir a
integridade dos ecossistemas terrestres e aquáticos, proteger os cursos
d`água, melhorar a qualidade de vida da população e disciplinar a
ocupação da área.
Silvestre Gorgulho
Tambaba é uma praia situada no município de Conde, a 17 km de João Pessoa-PB. É
conhecida por ser uma praia onde se pratica o nudismo, sendo a primeira
praia do Brasil a permitir o naturismo por lei municipal.
A área é
de rara beleza e tem mirantes lindíssimos que permitem observar a
natureza exuberante de toda a costa, com trilhas para caminhadas a beira
mar. Além das falésias multicoloridas, existe uma Unidade de
Conservação de uso sustentável – APA de Tambaba - que abrange parte da
microrregião do litoral sul do estado da Paraíba entre os municípios de
Conde, Alhandra e Pitimbú.
O nome vem do tupi-guarani e tem dois
significados: “o conteúdo das conchas” e “monte de Vênus”. Segundo a
lenda, uma bela índia de nome Tambaba, apaixonou-se por um guerreiro de
outra tribo. O cacique, pai de Tambaba, não permitiu o casamento. A bela
índia pôs-se a chorar e suas lágrimas inundaram as terras secas e
transformaram primeiro num lago e depois numa praia, com ondas suaves.
Deus sol eternizou o local como um templo natural do amor e da vida. A
praia, que tem uma topografia intimista e protegida, é um presente dos
deuses com suas águas cristalinas e mornas.
A área é de rara beleza e tem mirantes lindíssimos que permitem
observar a natureza exuberante de toda a costa, com trilhas para
caminhadas a beira mar. Além das falésias multicoloridas, existe uma
Unidade de Conservação de uso sustentável – APA de Tambaba - que abrange
parte da microrregião do litoral sul do estado da Paraíba entre os
municípios de Conde, Alhandra e Pitimbu.
Encontram-se inseridas na APA as praias de Tabatinga, Coqueirinho,
Tambaba, Graú e praia Bela e as localidades de Mata da Chica, Garapaú,
Andreza, Roncador e Mucatu.
A APA está em uma das mais belas áreas do litoral paraibano,
resguardando um mosaico de fitofisionomias da Floresta Atlântica, como a
mata de tabuleiro, a mata de reestinga e os maguezais. Além disso,
apresenta formações geomorfológicas de beleza singular como suas
falésias, nichos de cabeceiras, vales e canyons.
A APA de Tambaba tem por finalidade garantir a integridade dos
ecossistemas terrestres e aquáticos, proteger os cursos d`água que
integram a região, melhorar a qualidade de vida da população e
disciplinar a ocupação da área, para que esta não avance de forma
desordenada e em ritmo acelerado, como se apresentava antes da criação
da UC, contribuindo assim para a redução da degradação do ambiente
local e sua restauração futura.