Cidades,
Domingo, 26/02/2012
Álisson Arruda
Segundo o geógrafo do Departamento de Engenharia e Meio Ambiente do Campus IV da UFPB, Joel Santos, autor da pesquisa “Campo térmico urbano e sua relação com o uso e cobertura do solo em João Pessoa”, os bairros próximos à orla da Capital apresentaram as maiores diferenças de temperatura em relação à Mata do Buraquinho, considerada como ponto de referência nas condições térmicas para a população, por ser um local que se assemelha ao ambiente rural. “Quem mora na orla subentende-se que mora bem, mas as áreas mais nobres têm os piores parâmetros”, frisou.
Domingo, 26/02/2012
Álisson Arruda
A temperatura entre os bairros de João Pessoa varia até 5,32º C e os
níveis mais altos de ‘ilhas de calor’ e desconforto térmico estão
concentrados em Manaíra e Cabo Branco. Segundo pesquisa da Universidade
Federal da Paraíba (UFPB), as altas temperaturas são resultado do
aumento da área edificada e pavimentada, e a consequente redução de
áreas verdes. A projeção feita pelo estudo é que, daqui a 50 anos, as
ilhas de calor estarão espalhadas por toda cidade e os bairros atingirão
o nível mais alto na classificação de desconforto térmico.
Segundo o geógrafo do Departamento de Engenharia e Meio Ambiente do Campus IV da UFPB, Joel Santos, autor da pesquisa “Campo térmico urbano e sua relação com o uso e cobertura do solo em João Pessoa”, os bairros próximos à orla da Capital apresentaram as maiores diferenças de temperatura em relação à Mata do Buraquinho, considerada como ponto de referência nas condições térmicas para a população, por ser um local que se assemelha ao ambiente rural. “Quem mora na orla subentende-se que mora bem, mas as áreas mais nobres têm os piores parâmetros”, frisou.
Após Manaíra, seguem na lista dos bairros mais incômodos para os
moradores em relação à temperatura os de Cabo Branco, Bancários, Centro e
Mangabeira. Segundo o pesquisador, os dados são preocupantes, pois
afetam diretamente a qualidade de vida da população.
A pesquisa monitorou 10 pontos e aplicou um questionário aos moradores
para conferir o nível de incômodo em diferentes temperaturas. “Para
calcular o índice de desconforto térmico, utilizamos os dados de
temperatura e umidade do ar de cada local. Em Manaíra, a ilha de calor
foi de 5,32º C a mais que a Mata do Buraquinho”, esclareceu Joel Santos.
“Isso ocorre em função dos tipos de materiais empregados para
pavimentação e cobertura do solo associado ao aumento da área edificada
nesses bairros e sua urbanização, que compromete a cobertura vegetal
desses ambientes”, afirmou, acrescentando que no período seco a
intensidade da ilha de calor é ainda maior em relação ao período
chuvoso. Já o ponto que mais se aproximou no local de referência foi o
bairro dos Expedicionários. De lá até a Mata do Buraquinho a diferença é
de 3,52ºC. A justificativa está no fato de o bairro ser residencial com
áreas verdes ainda preservadas e pouca verticalização.
Sensação térmica é parcialmente desconfortável
A sensação térmica dos habitantes de João Pessoa, de maneira geral,
está classificada como parcialmente confortável ou desconfortável no
período seco e de confortável a parcialmente confortável nos meses de
chuva. No entanto, daqui a 50 anos, se forem mantidas as médias de
crescimento da temperatura e de redução da umidade do ar, não haverá
mais áreas consideradas confortáveis e todo o território será
classificado na escala mais alta do Índice de Desconforto Térmico (IDT).
A pesquisa realizada na UFPB fez um levantamento do crescimento da
temperatura desde 1963 e constatou que há um aumento de 0,034ºC a cada
ano e uma diminuição de 0,049 na umidade relativa do ar. “A temperatura
do ar e o nível de conforto térmico têm tendência crescente e a umidade
relativa tendência decrescente. Esses dados são baseados nos testes
estatísticos para série temporal de temperatura e umidade relativa do ar
referente há 48 anos de medições realizada pelo Estação Meteorológica
do INMET localizada na Br – 230”, esclareceu o professor Joel Santos.
De acordo com os dados da pesquisa, os cenários dos níveis térmicos
indicam condições de forte desconforto ambiental para os anos de 2050 e
2060, durante o período seco, e desconfortável para o período chuvoso no
ano de 2060 em toda área de estudo. Para os anos de 2020, 2030 e 2040
são previstos níveis de conforto térmico desconfortáveis para o período
seco e parcialmente confortável para o período chuvoso. “O bairro de
Manaíra é mais preocupante porque será o primeiro a entrar numa situação
alarmante”, destacou.
Intensidade máxima do calor ocorre à noite
A intensidade máxima da ilha de calor urbano em João Pessoa varia entre
3,33 °C e 5,32 °C e é um fenômeno que geralmente ocorre durante o
período noturno. O pesquisador Joel Santos esclareceu que isso ocorre
porque a intensidade máxima de temperatura e umidade relativa do ar são
essencialmente diurnos e, com isso, a pavimentação absorve a energia e
calor solar durante o dia e libera à noite.
Ele afirmou que a pavimentação de asfalto é a mais prejudicial porque
tem o poder de absorver ainda mais calor do que refletir. Os dados
coletados na pesquisa comprovaram aquilo que as pessoas já sentem nas
ruas, que são temperaturas mais elevadas sempre entre às 11 h e 14 h, e
as mínimas nas primeiras horas da manhã. “Mesmo que o pico da ilha de
calor seja registrado mais à noite, o desconforto é maior durante o dia
por causa da maior taxa de insolação”, destacou.
Pesquisa da UFPB calcula aquecimento causado pela urbanização
A pesquisa da UFPB é pioneira na Paraíba no sentido em que conseguiu
fazer uma amostragem para investigar todo o perímetro urbano e calcular o
aumento do desconforto térmico como resultado do processo de
urbanização da cidade. “Os trabalhos produzidos nessa área do
conhecimento para João Pessoa eram mais pontuais, se tratando de praças,
bairros e ruas, e agora, temos um referencial para toda cidade”,
destacou o professor Joel Santos, acrescentando que os dados obtidos
podem servir de subsídio para o planejamento e a gestão ambiental do
município.
A pesquisa foi resultado de um trabalho de conclusão de doutorado em
Recursos Naturais e faz parte de financiamento de um projeto aprovado
pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq). Os trabalhos foram feitos por dois anos e nove meses, incluindo o
período de medição das variáveis de temperatura e umidade relativa do
ar durante três meses no período chuvoso e seco.
Foram instalados equipamentos chamados termo-higrômetro em postes de
telefonia para coletar dados de temperatura e umidade, e o entorno de
cada ponto foi mapeado para verificar o uso do solo e material
empregado. Ele disse que, apesar de a pesquisa ter feito a comparação
entre 10 pontos, é preciso considerar que as condições térmicas de
determinado local podem se estender a outros bairros próximos ou variar
dentro no mesmo bairro. Com isso, os moradores da comunidade São Rafael,
no Castelo Branco, por exemplo, são diretamente beneficiados com as
condições térmicas da Mata.
“A ideia era verificar como esses materiais de recobrimento interferem
nas condições do campo térmico (desconforto térmico, formação de ilhas
de calor, etc) do clima urbano da cidade”, explicou o pesquisador. Após
essa etapa, foi feita a análise dos dados para se conhecer as condições
de conforto e desconforto térmico da população, com a aplicação de 300
questionários em horários distintos.
Verticalização precisa seguir parâmetros ambientais
A verticalização nas construções em João Pessoa está crescendo a cada
ano, mas precisam ser planejadas para garantir qualidade de vida dos
moradores. “Se antes se tinha o crescimento das áreas urbanizadas, hoje
nós verificamos o aumento da verticalização. Não condeno isso, mas deve
ser planejada. A cidade está crescendo levando em conta a questão da
especulação imobiliária, mas precisa de parâmetros ambientais”, afirmou.
Ele defende que o uso e ordenamento territorial da cidade devem levar
em consideração critérios que não sejam meramente econômicos, mas que
também envolvam critérios que garantam conforto para os cidadãos. Além
disso, ele afirmou que os resultados da pesquisa reforçam a importância
na legislação que proíbe a construção dos espigões próximos à orla.
Segundo o professor Joel Santos, por causa de um crescimento
despreocupado com o meio ambiente, a gestão pública hoje está tentando
corrigir, por exemplo, o erro de ocupação em áreas de risco nas margens
de rio. Para ele, a saída é continuar retirando as pessoas dos locais
inadequados e investir na ocupação comprometida com a questão ambiental,
valorizando a cobertura vegetal, mantendo as áreas que ainda têm e
repondo ou implantando novas áreas verdes.
Para ele, áreas verdes são fundamentais para manter a qualidade de vida
da população e devem estar bem distribuídas no perímetro urbano. Isso
porque, áreas verdes criadas ou preservadas distantes das áreas de maior
crescimento urbano não conseguem resolver o desconforto térmico dos
moradores. “Tem certa influência na cidade como um todo, mas é restrito
para locais com ilhas de calor mais intensas”, alertou.
Estudo teve parceria de professores da UFCG
A pesquisa foi realizada com orientação do professor da Universidade
Federal de Campina Grande (UFCG), Vicente de Paulo Rodrigues da Silva, e
do professor Eduardo Rodrigues Viana de Lima, da UFPB. Também
colaboraram com os trabalhos os professores Angelina Dias Leão Costa e
Lincoln Eloi de Araújo, ambos da UFPB. Alunos do curso de graduação e
pós-graduação de geografia, ecologia e arquitetura também participaram
do estudo.
De acordo com o professor Joel Santos, os resultados da pesquisa em
João Pessoa não diferem muito do que foi verificado em outras capitais
do Nordeste. No entanto, ele diz que é preciso estar atento ao porte da
cidade que não é tão grande como Recife e Fortaleza, por exemplo.
Segundo ele, o objetivo agora é estudar a variação gradual das condições
de temperatura e umidade do ar ao se afastar dos pontos analisados.
Isso poderá revelar, por exemplo, até onde vai a influência da Mata do
Buraquinho nos bairros vizinhos.
Manaíra é bairro mais quente da Capital
Para suportar o calor no bairro de Manaíra, considerado o mais quente
segundo a pesquisa da UFPB, os moradores precisam colocar ventiladores e
ar condicionados em vários cômodos da casa. É o caso da artista
plástica Edclée Carvalho. Para ela, “nem ar condicionado consegue vencer
o calor e é preciso até levar um ventilador portátil dentro de casa”.
Ela relatou que há mais de dez anos mora no bairro e acredita que a
sensação de calor só aumenta. “Sinto muito calor aqui e a impressão que
dá é que a cada ano a temperatura só aumenta. Não tem como dormir sem ar
condicionado e para trabalhar eu tenho que ligar o ar condicionado e o
ventilador no ateliê. Todos os cômodos da minha casa têm ventilador no
teto. Só na sala coloquei dois porque senão ninguém aguenta”, disse.
De acordo com a artista plástica, mesmo no inverno, são poucos os dias
que ela se sente confortável apenas com as janelas do apartamento
abertas. Ela disse que, ao longo dos anos, verifica a construção de
prédios e redução das áreas verdes. “As praças do bairro são pouco
arborizadas. Era para ser tudo verde para ver se melhorava essa
temperatura. Nem nos canteiros das ruas têm árvores”, defendeu.
Manaíra será um dos bairros atendidos pelo projeto de arborização da
Prefeitura da Capital. A meta é arborizar 285 ruas em oito bairros, em
zonas residenciais. Pelo menos10 mudas serão plantadas por rua,
totalizando 2.850 mudas. Em Manaíra, serão arborizadas as avenidas João
Câncio da Silva, Monteiro da França, Esperança, João Franca e Ingá.
Semam se baseia em pesquisa para plantar árvores
Os técnicos da Secretaria de Meio Ambiente de João Pessoa (Semam) já
tomaram conhecimento da pesquisa através de um evento acadêmico, mas
como o trabalho foi apresentado só em dezembro do ano passado, ainda não
foi possível utilizar os resultados como referência para os projetos da
Prefeitura de João Pessoa. No entanto, de acordo com a assessoria de
imprensa da Semam, o setor já possui um levantamento que consta no
projeto “João Pessoa verde para o mundo” e no Planejamento da
Arborização Urbana para 2012. Nesse levantamento a Semam priorizou áreas
que apresentam menor cobertura vegetal e maior índice de urbanização,
que são fatores que provocam a formação de ilhas de calor.
Por esses motivos, os bairros da orla foram contemplados, segundo a
secretária de Meio Ambiente da Capital, Lígia Tavares. “A Constituição
Estadual sobre a limitação dos gabaritos na orla é clara no que diz
respeito à construção de prédios no litoral paraibano. Entendemos que a
Constituição deve ser respeitada. A zona costeira, em todo território da
Paraíba, é patrimônio ambiental, cultural, paisagístico, histórico e
ecológico”, afirmou.
Por isso, ela disse que é preciso estar atento à lei, que limita a
construção de prédios acima de 35 metros de altura nos 500 metros de
largura a partir da preamar de sizígia, que é a maior maré registrada no
litoral. “Já na primeira quadra da praia, deve ser respeitado o limite
de 150 metros da maior maré, só podendo ser construídos prédios de até
12 metros e 90 centímetros”, complementou Lígia Tavares.
PMJP elaborou projeto de arborização
A prefeitura de João Pessoa elaborou um planejamento de arborização
urbana para este ano. As áreas foram sugeridas pelos técnicos da Semam,
considerando a demanda da população e a necessidade de alguns locais
específicos. Foram observados critérios como áreas públicas, parques,
praças e zonas comerciais e residenciais com baixo índice de
arborização, além de novos loteamentos.
Segundo o planejamento, serão arborizadas 133 escolas e CREIs, e 127
unidades de saúde; zonas residenciais em Cidade Verde, Bairro das
Indústrias, Cidade Verde Mangabeira, Bairro dos Estados, Manaíra,
Tambaú, Cabo Branco, Mangabeira VII e José Américo; zonas comerciais,
como a Avenida Epitácio Pessoa e Centro; corredores ecológicos, como o
Engenho Triunfo, em Mumbaba; além de plantio em áreas de preservação
permanente ou degradadas, como o Parque Natural Municipal do Cuiá,
girador da UFPB, Parque Temático Augusto dos Anjos, Bosque das Águas,
Parque Parayba e áreas de mata ciliar e nascente do Rio Cabelo.
João Pessoa foi primeira a ter Plano da Mata Atlântica
Segundo a Semam, a gestão municipal está preocupada com as questões
ambientais e, por isso, João Pessoa foi a primeira cidade brasileira a
elaborar o Plano da Mata Atlântica. Lançado em novembro de 2010, o Plano
foi elaborado pelos técnicos da Divisão de Estudos e Pesquisas (DIEP)
da Semam, em parceria com Fundação SOS Mata Atlântica. Em junho passado,
a Câmara de Vereadores aprovou o Sistema Municipal de Áreas Protegidas
(SMAP), que define e estabelece critérios e normas para criação,
implantação e gestão das Unidades de Conservação (UCs) da natureza e
parques administrados pela prefeitura.
Segundo a Semam, com o sistema a cidade efetivou uma política de
conservação e recuperação do meio ambiente, por meio da criação e gestão
de áreas protegidas no município. O SMAP estabeleceu os parques de
requalificação ambiental, visando ampliar a qualidade ambiental para as
áreas de moradia popular.
Além disso, o Viveiro Municipal de Plantas Nativas da Prefeitura de
João Pessoa foi contemplado com projeto do Fundo Nacional de
Desenvolvimento Florestal (FNDF), gerido pelo Serviço Florestal
Brasileiro (SFB), que vai beneficiar cerca de 100 coletores de sementes e
viveiristas na Mata Atlântica e mais 300 famílias de extrativistas na
Amazônia. A ação fortalece a produção de sementes e mudas de espécies
nativas da Mata Atlântica, para restauração florestal no Nordeste. O
Viveiro produz mudas recomposição de áreas degradadas. Em 2011, produziu
38.766 mudas de árvores nativas e distribuídas outras oito mil mudas.
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